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Rotatividade de mão de obra em alta no setor elétrico

Geração distribuída e comercialização são as mais afetadas por turnover, que aumentou 19% em 2024, segundo pesquisa da Fesa Group. Entre as causas estão a digitalização, o avanço das renováveis e a regulação

Por Nelson Valencio

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Segmentos como os de geração distribuída e comercialização têm rotatividade acima da média, com 27,8% e 22,6% respectivamente (Foto: Divulgação/Aldo Solar)

O setor elétrico enfrenta um cenário de aumento de rotatividade de mão-de–obra. De acordo com a FESA Group, especializada em recursos humanos, o turnover médio – outra forma de chamar esse processo – chegou a 16,65% em 2024. Isso significa um incremento de 19% em relação ao ano anterior, segundo o levantamento recém-divulgado pela consultoria. 

Os cargos mais impactados incluem, em primeiro lugar, os engenheiros, especialmente aqueles que atuam nas áreas de operação, manutenção e projetos. Os especialistas em tecnologia e digitalização também estão migrando para outros setores. Entram nesse rol analistas de dados, profissionais de automação e inovação, o que pode afetar a transição digital entre as concessionárias.  

Outro grupo atingido são os gestores de áreas técnicas, responsáveis por liderar equipes de manutenção, operação e comercialização.

Embora esteja abaixo da média brasileira de 56%, a rotatividade pesa no orçamento do setor. A reposição da mão-de-obra perdida pode custar entre 50% e 200% do salário anual do profissional, métrica geral para o mercado brasileiro de acordo com consultoria Robert Half. 

Em subsetores como os de geração distribuída e comercialização, a conta pode ficar ainda mais salgada, uma vez que eles têm uma rotatividade acima da média, com respectivamente, 27,8% e 22,6%. 

Também é importante lembrar que se trata de profissionais especializados, que demandam formação e treinamentos específicos. Um exemplo é o curso proposto pela Enel, em São Paulo, para capacitação básica de eletricistas iniciantes. Estruturado com o Senai, a formação dura seis meses e funciona como a primeira etapa da carreira de um profissional na base do sistema. 

Para Débora Celeti (foto), especialista nos setores de energia, indústria e infraestrutura da Fesa Group e responsável pela pesquisa, o desafio é duplo. Ou seja, é necessário reter os profissionais experientes e atrair novos talentos com perfil mais inovador e orientado a dados, capazes de lidar com estratégias comerciais mais sofisticadas e com a evolução do relacionamento com clientes finais. 

“A alta demanda por profissionais qualificados tem intensificado a competição por talentos técnicos e estratégicos, especialmente nas áreas de engenharia, tecnologia e gestão de projetos”, explica. 

De acordo com ela, a rotatividade no setor é resultado de um conjunto de fatores interligados que refletem transformações profundas. Entram nessa conta o avanço das fontes renováveis e a digitalização das operações, tendências que têm gerado uma demanda crescente por novos perfis profissionais, muitas vezes escassos no mercado. As mudanças regulatórias e incertezas econômicas são outras causas.  

Enel tem curso para capacitação de eletricistas iniciantes: profissionais especializados demandam formação e treinamentos específicos (Foto: Divulgação)

Débora lembra ainda que, no setor elétrico, a cultura corporativa pode ser um catalisador do turnover. Explicando: o ambiente tradicional, muitas vezes associado a estruturas hierárquicas rígidas, baixa agilidade e pouca inovação, tem sido um fator de desengajamento, principalmente para profissionais mais jovens. 

Outro problema paralelo é o envelhecimento da força de trabalho. A pesquisa mostrou que a liderança de muitas empresas está próxima da aposentadoria, o que pressiona a busca e retenção de novos talentos. Além disso, há casos de aposentadorias precoces, impulsionadas por pacotes de incentivo ou busca por qualidade de vida.

Uma boa notícia é que as causas de fuga de talentos também podem ser o remédio para a atração e retenção. Da mesma forma que profissionais especializados estão migrando para setores considerados mais dinâmicos, como tecnologia, telecomunicações e consultorias, há um movimento inverso. Para alguns deles, já atuantes em áreas de tecnologia, a digitalização do setor elétrico pode ser uma atração.

“Essa aproximação tem sido impulsionada pela convergência entre os dois mundos, especialmente com a expansão de data centers, projetos de digitalização, automação de redes e integração de soluções energéticas com tecnologia da informação”, resume Débora. 

Ela destaca que existe uma procura por perfis com competências digitais, análise de dados e tecnologia aplicada à energia. A “importação de talentos" no setor elétrico acontece especialmente nas áreas ligadas à transição energética e digitalização.

Movimento inverso: expansão de data centers, projetos de digitalização, automação de redes e integração de soluções energéticas com tecnologia da informação são fatores de atração de profissionais (Foto: Divulgação/Copel)

A consultora destaca que, entre as práticas mais adotadas pelas organizações líderes e com menor turnover, estão os programas estruturados de desenvolvimento e capacitação contínua, que oferecem oportunidades reais de crescimento técnico e comportamental. 

Os planos de carreira claros e bem definidos, aliados à revisão de pacotes de benefícios, também têm sido ferramentas importantes para aumentar o engajamento e reduzir a rotatividade. “Programas de engajamento das lideranças têm sido fundamentais para preparar os gestores para esse novo papel, tornando-os agentes ativos na retenção de talentos”, complementa Débora. 

Segundo a consultora, dois aspectos são importantes para a retenção de talentos. O primeiro deles é o de saúde mental, a razão mais relevante para ausências no trabalho no biênio 2023-24. Outro dado expressivo mostrado na pesquisa é que 55,5% das saídas registradas em 2024 foram por pedido de desligamento voluntário, reforçando a urgência das empresas em compreender e agir sobre esses fatores, de forma a reduzir a rotatividade.

Embora essa pesquisa não tenha investigado diretamente os modelos de trabalho, Débora acredita que a maioria das empresas do setor adota o modelo híbrido no formato 3x2 (três dias presenciais e dois remotos), pelo menos em áreas administrativas. 

A diversidade geracional igualmente traz desafios concretos que impactam o turnover. Os profissionais das gerações Baby Boomer e X, embora experientes, enfrentam preconceitos relacionados à idade. Com isso, são afastados de processos seletivos, gerando desperdício de talentos e rotatividade evitável. 

Já os Millennials e Gen Z, apesar de valorizarem propósito, agilidade e flexibilidade, apresentam lacunas comportamentais e técnicas que, especialmente no setor de energia, podem levar à insatisfação e ao desligamento quando essas necessidades não são atendidas. 

“Com até cinco gerações convivendo simultaneamente, as divergências nas expectativas e formas de trabalho aumentam o risco de desengajamento e perdas de talentos”, alerta. “Para mitigar esse impacto, é essencial adotar uma gestão segmentada de pessoas, reduzindo o turnover e promovendo um ambiente de trabalho mais equilibrado e produtivo”, finaliza.

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