Opinião
Petróleo em 2023: novo ano, mas velhos desafios
O desafio de 2023 será o aumento da capacidade de ofertantes em fornecer maiores volumes de óleo e gás. Só assim que a economia global não ficará à mercê de choques de oferta e, portanto, vulnerável a altas inflacionárias repentinas
2022 foi um ano histórico para o mercado de petróleo. O existente aperto no lado da oferta foi exacerbado pela invasão da Ucrânia, obrigando os traders a se distanciar voluntariamente da oferta russa em fevereiro de 2022. As sanções financeiras, aliadas às restrições de exportações, dificultaram ainda mais os negócios com Moscou. Visando à comercialização do óleo, os russos o ofertaram com preços muito abaixo do Brent em seus portos. Isto possibilitou que fosse equalizada a relação de risco e retorno de algumas tradings aventureiras e de nações asiáticas interessadas, permitindo a continuidade das exportações.
China e Índia garantiram que as receitas provenientes da venda de petróleo da Rússia não caíssem, já que ambos se aproveitaram dos descontos para aumentar as importações, mesmo que a um custo reputacional elevado. No entanto, a Europa, até então o destino natural da energia russa em função da proximidade geográfica, teve que buscar outros fornecedores para compensar a perda desta oferta. Tanto para óleo quanto para gás, sem contar os derivados.
Uma grande reorganização no mercado de energia, seja do ponto de vista logístico quanto do geopolítico, marcou 2022. Neste ano, os EUA se tornaram o posto de combustível do mundo, com exportações de derivados, principalmente de diesel, atingindo as máximas históricas. Consumidores receosos de não conseguir acesso ao produto russo se voltaram à oferta confiável e estável dos norte-americanos, que agora se encontram também entre os maiores exportadores de gás liquefeito.
A percepção de falta de oferta e o senso de urgência fez com que preços, desde petróleo até derivados, disparassem o suficiente para ocasionar um ambiente inflacionário global. O remédio foi o mesmo ao redor do mundo: taxas de juros nas alturas, com o objetivo de criar uma recessão forte o suficiente para enfraquecer a demanda. Só assim os balanços de oferta e demanda ficariam frouxos, e preços cairiam. Entretanto, trata-se de uma solução de curto prazo, porque não resolve a notável e perigosa falta de investimento global em exploração e produção (E&P) de petróleo e gás.
O desafio de 2023 será o aumento da capacidade de ofertantes em fornecer maiores volumes de óleo e gás. Só assim que a economia global não ficará à mercê de choques de oferta e, portanto, vulnerável a altas inflacionárias repentinas. Não será uma tarefa fácil, pois o ambiente macroeconômico internacional apresenta baixa liquidez. Taxas de juros nunca estiveram tão altas nos últimos 40 anos, tornando os custos de dívida significativamente elevados.
Além disto, existe outro componente que explica o porquê de a oferta de óleo e gás apresentar um caráter inelástico atualmente. Produtores de capital aberto têm sido pressionados pelos investidores para que aumentem os dividendos, mesmo que ao custo das despesas de capital. Esta estratégia transformou a indústria de óleo gás em uma verdadeira máquina de gerar caixa, quase que usado em sua totalidade para o pagamento de dividendos, ou para a recompra de ações.
A maximização do valor do acionista, portanto, teve um custo inflacionário à economia global, porque ela impediu que produtores elaborassem planos mais ambiciosos de investimento em E&P. Isto nos torna incapazes de termos volumes de petróleo e gás suficientemente grandes para que consigamos lidar com eventuais choques de oferta.
Somem-se a esta conjuntura as questões geopolíticas progressivamente mais acentuadas, que criam incertezas quanto à disponibilidade de commodities energéticas no mercado. Portanto, é imperativo que a economia global se prepare para um ambiente de disponibilidade volátil de óleo e gás, assim como de derivados.
Diante deste cenário, pode-se dizer que o ano começa com todos olhando para o retrovisor: ano novo, problemas velhos.
Heitor Paiva é analista da Hedgepoint Global Markets. Atua com inteligência de mercado e pesquisa no mercado de câmbio e commodities, principalmente através de análise fundamentalista aplicada às commodities energéticas.