Opinião

Nível de Prontidão Tecnológica e Nível de Maturidade da Inovação

A capacidade do Brasil de desenvolver invenções engenhosas tem sido demonstrada com notável frequência, do 14-bis ao Hisep. Contudo, nossa capacidade de transformar invenções em inovações nem sempre se materializa

Por Telmo Ghiorzi

Compartilhe Facebook Instagram Twitter Linkedin Whatsapp

Há 50 anos, a Nasa criou e passou a utilizar o TRL, sigla de Technology Readiness Level, ou Nível de Prontidão Tecnológica. Trata-se de modelo para avaliar a maturidade de uma tecnologia em desenvolvimento. Há cerca de 15 anos, o Instituto Real de Tecnologia, o KTH, da Suécia, começou a conceber e disseminar o IRL, a sigla para Innovation Readiness Level, que em tradução livre seria o Nível de Maturidade da Inovação. O IRL é inspirado no TRL, mas vai muito além em termos de abrangência e profundidade no que se refere à inovação.

O TRL descreve 9 níveis de maturidade, começando com o nível 1: “princípios básicos observados”, e terminando com o nível 9: “sistema real testado em ambiente operacional”, passando por vários níveis intermediários de validações e demonstrações. O TRL reflete visão linear do desenvolvimento de invenções.

O IRL estabelece 6 diferentes dimensões, cada uma com 9 níveis de prontidão. Além da dimensão tecnologia do TRL, o IRL inclui outras 5 dimensões. A dimensão Cliente (CRL), que avalia a maturidade do mercado para receber a inovação. A dimensão Negócios (business), com a sigla BRL, que avalia viabilidade comercial e custos e receitas potenciais. A dimensão Propriedade Intelectual (IPR), que trata das proteções das patentes e marcas da possível inovação. A dimensão equipe (TMRL), que aborda a capacidade de a equipe envolvida desenvolver a tecnologia (invenção) e introduzir a novidade no mercado (inovação). E, por último, a dimensão financiamento (FRL), que avalia a disponibilidade de recursos para financiar os esforços de inovação.

Em resumo, o TRL trata de invenções engenhosas, frequentemente, e que, algumas vezes, revelam-se funcionais. O IRL trata das inovações, ou seja, das novidades que, ao serem introduzidas no ambiente produtivo, geram o monopólio temporário e os lucros extraordinários para as empresas que as introduzem e que produzem o permanente desequilíbrio que caracteriza a dinâmica da economia real.

O TRL, apesar de menos abrangente e profundo, aparentemente em razão de seus 50 anos de existência, ainda é mais presente tanto nas empresas quanto nas políticas públicas que moldam os esforços para inovação no Brasil. A Finep, por exemplo, menciona apenas o TRL em seu website e documentos de gestão de iniciativas. No caso do setor de petróleo, o Manual Orientativo sobre a Resolução 918/2023, que regula a aplicação dos recursos para Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação no setor, traz também exclusivamente o TRL.

Embora importante, a dimensão TRL é insuficiente para tratar de tema tão complexo e repleto de incertezas como é o caso das inovações. Mas são as inovações, não as invenções, que geram os investimentos, o consumo, os transbordamentos, as ramificações e outros efeitos econômicos. São, portanto, as inovações que geram empregos, renda e melhoria de outros indicadores sociais.

A capacidade do Brasil de desenvolver invenções engenhosas e funcionais tem sido demonstrada com notável frequência e destaque (do 14-bis ao Hisep, para citar apenas dois exemplos) Contudo, nossa capacidade de transformar invenções em inovações e, assim, promover desenvolvimento socioeconômico, nem sempre se materializa. Entre outras várias razões, talvez a falta de foco e de instrumentos inspirados no IRL sejam indutores destes resultados nem sempre positivos.

O IRL reflete uma visão mais abrangente, profunda e eficaz do processo de inovar. O IRL incorpora o caráter sistêmico, multidimensional e repleto de incertezas que caracteriza o processo de inovar. O conceito está razoavelmente desenvolvido e é utilizado pelo exemplar país que o criou, a Suécia, e pelos demais países desenvolvidos, ainda que nem sempre eles sigam estritamente o modelo do IRL. Guardadas as diferenças de contexto, nada impede que o Brasil adote o IRL, para além do TRL, e assim busque, em vez de apenas criatividade e engenhosidade, as inovações e o desenvolvimento socioeconômico que delas resulta.

Outros Artigos