
Opinião
A Energia como pauta no Brics
Energia está cada vez mais presente nas discussões, em função de questões estratégicas que se tornaram mais evidentes com os últimos acontecimentos globais, como a pandemia, os conflitos armados e a questão climática

Desde o início deste ano, o Brasil assumiu a presidência rotativa e temporária do Brics, que culminará com um grande encontro da cúpula nos dias 6 e 7 de julho, na cidade do Rio de Janeiro, e contará com a presença de dezenas de chefes de Estado, não só dos atuais 11 países-membros e países-parceiros, mas também de diversos países convidados, entre eles alguns que pretendem futuramente se incorporar a esse bloco.
Na prática, o Brics é um grande grupo de cooperação econômica que surgiu em 2009 com quatro países - Brasil, Rússia, Índia e China - e que, a partir de 2011, passou a se denominar Brics com a entrada da África do Sul.
O objetivo de sua concepção era permitir que países fora dos tradicionais blocos regionais, mas com elevada representatividade em suas regiões, pudessem agir em articulação com diversos fóruns e com uma agenda internacional capaz de afetar a economia global, realizando abordagens em seus interesses comuns. Inicialmente, essa articulação se concentrava basicamente em economias do Hemisfério Sul, razão pela qual surgiu a expressão “Sul Global”.
Atualmente, o Brics é composto por 11 países-membros, que, a partir da Cúpula de Joanesburgo em 2023, optaram pela incorporação de seis entrantes: Etiópia, Egito, Irã, Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos e Indonésia.
Diversos outros países demonstraram interesse em participar como “países-parceiros” na Cúpula de 2024, realizada em Kazan, na Rússia, destacando-se que, até maio deste ano, apesar de participarem das reuniões preparatórias, a Arábia Saudita ainda não havia aderido formalmente como país-membro do Brics. Dentre os países-parceiros estão atualmente: Belarus, Bolívia, Cuba, Cazaquistão, Malásia, Tailândia, Uganda e Uzbequistão.
Embora, inicialmente, os pilares estivessem focados basicamente em “política e segurança”, “economia e finanças” e “sociedade civil”, o tema energia está cada vez mais presente nessas discussões, especialmente nessa próxima cúpula no Rio, em função das questões estratégicas que se tornaram mais evidentes com os últimos acontecimentos globais, como a pandemia, os conflitos armados e a questão climática, potencializada pelo próprio posicionamento do atual governo americano em relação a acordos climáticos do passado.
Um estudo especial, muito interessante, apresentado recentemente pelo Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP) e intitulado “Brics+ e o Setor de Energia” traz números extremamente relevantes sobre o tema.
Nessa linha, podemos observar a discussão climática entre os países-membros originários do Brics, que, segundo fontes da IEA de 2024, apresentam na matriz energética baseada em carvão as seguintes participações: China (61%), Rússia (16,5%), Índia (45%) e África do Sul (70,9%), contrastando com o Brasil, que registra apenas 4,4%, o que ilustra bem como se comporta a transição energética para uma matriz de menor emissão de carbono nesses países.
No cenário da produção de petróleo, o Brics ocupa posições de destaque no ranking do Energy Institute: Rússia (2º), Arábia Saudita (3º), China (6º), Irã (7º), Brasil (8º) e Emirados Árabes Unidos (9º). Ou seja, dos dez maiores países produtores de petróleo do mundo, seis são membros do Brics, sendo todos exportadores, com exceção da China.
Nesse contexto, o princípio da transição energética em muitos desses países tem sido fortemente focado no gás natural, o que se revela especialmente relevante para Irã, Emirados Árabes Unidos e Rússia. Já no Brasil, nossa participação em fontes renováveis de baixa emissão é a mais significativa entre os membros originais do Brics.
Além disso, ao compor uma matriz mais limpa nesses países, como no próprio Brasil, fica nítido que não se poderá abdicar do financiamento e do subsídio das fontes fósseis, condição que estará presente nas discussões futuras, assim como na própria COP 30, que também acontecerá no Brasil, em novembro deste ano, no Pará.
Em 2024, pela primeira vez, a participação das fontes não-fósseis na capacidade instalada dos nove países originais do Brics ultrapassou a margem de 50 %, marco esperado apenas para 2025, mas impulsionado por adições recordes de energia limpa.
Somente na China foram instalados 356 GW de capacidade solar e eólica em 2024, a maior expansão energética da história de um país, enquanto a Índia registrou 30 GW de novas fontes limpas no ano fiscal encerrado em abril de 2025.
Mesmo assim, esse avanço foi complementar à expansão das fontes de energia fósseis, com a aprovação de 66,7 GW de novas usinas a carvão e 94,5 GW em construção na China, destacando o fato de que a energia de base segue sendo não só existindo, mas expandindo em grandes volumes.
Dentro desse cenário de países-membros e países-parceiros que compõem o Brics, a questão energética ganhará cada vez mais força nas discussões da próxima cúpula, associada à mudança climática e à forma e velocidade do processo de transição energética gradativa, que seja segura e, ao mesmo tempo, equitativa, considerando os diversos níveis de desenvolvimento econômico no contexto global. Vale à pena acompanhar essa discussão.