RS recorre ao trigo para reduzir sua dependência de etanol e constrói duas usinas de etanol de trigo no estado

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RS recorre ao trigo para reduzir sua dependência de etanol

O Rio Grande do Sul importa todo o etanol que consome. Na impossibilidade climática de produzir com cana ou milho, o estado terá duas usinas que produzirão etanol de trigo e, ao mesmo tempo, estimulará a produção do cereal no inverno, quando cai bastante

Por Eugênio Melloni

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Capacidade de produção da usina da CB Bioenergia, de 12 milhões de litros/ano de etanol, poderá ser elevada para até 50 milhões de litros/ano no médio prazo (Foto: Divulgação/CB Bioenergia)

Segundo maior produtor de trigo do país, o Rio Grande do Sul está encontrando na tradicional cultura de inverno a solução para fomentar a produção de etanol no estado. Pelo menos dois projetos de usinas que utilizarão o cereal na produção do biocombustível estão sendo desenvolvidos nos municípios gaúchos de Passo Fundo e Santiago.

Os projetos oferecem como benefícios ampliar a demanda pelo trigo, incentivando os agricultores ao plantio, além de estimular a produção de etanol, já que o Rio Grande do Sul importa todo o combustível que consome de outros Estados.

Em Passo Fundo, a Be8 está investindo R$ 1 bilhão no desenvolvimento de um projeto que mescla a produção de etanol de trigo com subprodutos a serem utilizados em ração animal e também na panificação. Em Santiago, a CB BioEnergia já aportou R$ 100 milhões em uma planta que utilizará o cereal típico de inverno para produzir etanol hidratado, álcool neutro - utilizado na fabricação de cosméticos e de bebidas -, subprodutos para ração animal e CO2 para gaseificação de refrigerantes.

Os projetos de etanol a partir do trigo atendem a um anseio do governo do Estado, que desde 2021 conta com o Programa Pró-Etanol, destinado a atrair investimentos oferecendo incentivos fiscais tanto na instalação quanto para operação de indústrias de biocombustíveis no RS. Com a iniciativa, o governo estadual pretende ampliar também a demanda interna por essas culturas de inverno, de forma a incentivar a expansão na produção agrícola.

A Secretaria da Agricultura, Pecuária, Produção Sustentável e Irrigação do Estado informou que, com esse incentivo, já foram lançados projetos de usinas de etanol à base de trigo e outros grãos que somam o investimento de R$ 1 bilhão. A previsão é o uso de 790 milhões de toneladas de trigo, o que equivale a 16% da colheita gaúcha e 8% da nacional, segundo a secretaria.

Tiago Gorski Lacerda, diretor da CB BioEnergiaDe acordo com Tiago Gorski Lacerda (foto), diretor da CB BioEnergia, os projetos de produção de etanol de trigo poderão estimular o plantio de trigo e outras culturas de inverno, vencendo uma resistência do agricultor a produzir na estação do frio. Ele explica que o trigo é uma planta muito delicada e muito suscetível à ação do clima, que resulta com frequência em quebras de safra ou em produção de cereais de baixa qualidade.

A ocorrência de chuvas em determinadas etapas do cultivo pode, por exemplo, comprometer a qualidade da produção, tornando o cereal impróprio para o uso na panificação ou impedindo o seu cultivo. “O Rio Grande do Sul cultiva no verão 12 milhões de hectares. Por conta das dificuldades proporcionadas pelo clima, no inverno a área de plantio cai para menos de 2 milhões de hectares”, explica.

Plantio de trigo no inverno no RS

Plantio no inverno de trigo, impróprio para indústria de panificação, será usado para a produção de etanol no RS (Foto: Deise Froelich/Emater RS)

A produção do etanol, na prática, cria um mercado para o trigo que não atende aos requisitos de qualidade da indústria de panificação, diz o executivo. “Nós vamos usar o trigo de baixa qualidade para produção de etanol. Não vamos usar trigo utilizado como alimento para produzir etanol”, ressalva, lembrando que a empresa recebe com frequência esse tipo de questionamento.

Gorski explica também que, enquanto em outros estados o milho vem sendo utilizado para a produção de etanol, no Rio Grande do Sul a cultura não encontra condições adequadas para o desenvolvimento. No verão, explica ele, os produtores rurais se voltam totalmente para a soja. No inverno, o milho não se desenvolve bem devido ao frio rigoroso na região.

CB BioEnergia pronta para iniciar a produção

A usina de etanol de trigo da CB BioEnergia está na fase final de obras, com o início de operação previsto para os próximos meses. A companhia aguarda, nesse momento, a obtenção da licença ambiental da planta, que deverá consumir diariamente 100 toneladas de matéria-prima e produzir 12 milhões de litros de etanol por ano.

Tiago Gorski Lacerda, diretor da CB BioEnergia, explica que a companhia estudou bastante as experiências de outros países com a produção de etanol a partir do trigo antes de investir na empreitada. “Em países da Europa e da Ásia já se produz há um bom tempo o etanol de trigo”, diz ele. O processo, segundo o executivo, é muito semelhante ao utilizado na produção do etanol a partir do milho.

Usina de etanol de trigo da CB Bioenergia

Planta da CB Bioenergia deverá consumir diariamente 100 toneladas de matéria-prima e produzir 12 milhões de litros de etanol por ano (Foto: Divulgação/CB Bioenergia)

A CB BioEnergia tem a expectativa de promover futuras expansões de sua capacidade de produção. “A usina está instalada em uma área de 15 hectares. Nós estamos aproveitando, com o projeto, apenas 4 hectares. Temos, então, condições para ampliar consideravelmente a nossa unidade”, diz Lacerda.

Conforme informou o presidente da companhia, Cassio Bonotto, em entrevistas à imprensa, a expectativa é elevar a capacidade de produção para até 50 milhões de litros anuais de etanol anidro no médio prazo, mediante investimentos estimados em cerca de R$ 500 milhões. 

Be8 mescla etanol com outros produtos à base de trigo

A Be8, do ECB Group, atingiu, no início deste mês, 20% da construção de seu complexo industrial, que está sendo erguido em uma área de 45 hectares em Passo Fundo. O complexo, que abrigará a usina de etanol de trigo, uma unidade de produção de DDGs (Distiller’s Dried Grains with Solubles, ou Grãos Secos de Destilaria com Solúveis) e outra voltada para fabricar glúten vital, iniciará sua operação no próximo ano, de acordo com as previsões da empresa.

Unidade da Be8 em Passo Fundo (RS)

Unidade da Be8 em Passo Fundo: usina de etanol utilizará, além do trigo, cereais como triticale e milho para produzir 210 milhões de litros de etanol (Foto: Divulgação/Be8)

A usina será flexível, produzindo tanto etanol anidro e hidratado. O trigo também será utilizado para produzir os DDGs, destinados ao mercado de rações animais, e o glúten vital, um produto utilizado para melhorar a qualidade das farinhas utilizadas na panificação.

A usina está estrategicamente instalada em uma área de produção de trigo, de forma a facilitar o fornecimento da matéria-prima. A unidade processará 525.000 toneladas de cereais de inverno anualmente. Além do trigo, a usina também utilizará triticale e milho para produzir 210 milhões de litros de etanol, 153 mil toneladas de DDGS e 27 mil toneladas de glúten vital.

A produção de glúten vital é pioneira no Brasil. Atualmente, todo o produto consumido no país é importado. A capacidade de produção da usina é suficiente para atender integralmente o mercado brasileiro, além de fornecer o produto para o Mercosul.

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