
São Paulo, sem a eletrificação da frota, recorre ao biometano
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São Paulo, sem a eletrificação da frota, recorre ao biometano
Dificuldades na ligação das garagens de ônibus à rede elétrica para atender a demanda de carregamento leva a Prefeitura a abrir espaço para os coletivos a biometano, rumo à meta de emissão zero de CO2 até 2038

Os caminhões movidos a biometano vão avançando, aos poucos, na agenda de descarbonização do transporte coletivo da capital paulista, ocupando espaços reservados até então exclusivamente para os modelos elétricos. No início de setembro, essa mudança ganhou contornos mais nítidos com a assinatura, pelo prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes, do decreto municipal nº 64.519, que instituiu o Programa BioSP. O programa determina a incorporação de ônibus movidos a biometano na operação do transporte coletivo público no município.
“É fundamental avançar na substituição dos ônibus e caminhões a diesel por veículos movidos a energia limpa, seja biometano ou eletricidade”, disse o prefeito Ricardo Nunes ao lançar o programa. A introdução do biometano está diretamente relacionada com os obstáculos encontrados na ampliação da frota de ônibus elétricos, principal rota de descarbonização definida pelo prefeito em seu mandato anterior.
Prefeitura persegue emissão zero em 2038
A Prefeitura de São Paulo busca, com o estímulo ao uso do biometano nos ônibus, dar um salto na descarbonização do transporte urbano. Em relação ao diesel, o biometano pode reduzir em até 95% as emissões de CO2, além de diminuir em até 85% a emissão de óxido de nitrogênio (NOx) e materiais particulados na atmosfera. A Prefeitura persegue a meta de atingir emissões zero de CO2 até 2038. Como parte desse compromisso, desde 2022 as operadoras de transporte coletivo da capital são proibidas de adquirir ônibus a diesel.
O decreto municipal determina que a adesão das concessionárias será voluntária, devendo ser realizada por meio de aditivos aos contratos em vigência. A forma como se dará a remuneração das companhias ainda deverá ser determinada.
O decreto prevê também um chamamento público para fornecimento de biometano. De acordo com fontes que participam das discussões, a chamada de preço permitirá a obtenção de informações importantes para balizar o projeto. Segundo dados da ABiogás, somente os aterros sanitários do município de São Paulo poderiam atender à metade da demanda da frota de ônibus a diesel.
Ônibus a diesel convertido para uso do biometano circula em caráter de teste em São Paulo (Foto: Divulgação)
O prefeito Ricardo Nunes afirmou, ao anunciar o programa, que ainda não há valores definidos para o custo do abastecimento dos ônibus com o biometano. O abastecimento de um ônibus a diesel tem um custo de, em média, R$ 25 mil por mês; o custo para um ônibus elétrico, no mesmo período, é de cerca de R$ 5 mil. A indicação de que a Prefeitura garantirá o equilíbrio econômico-financeiro dos contratos, o que poderá envolver alguma subvenção, tranquiliza, no entanto, os operadores, segundo fontes que acompanham as discussões.
De acordo com o consultor Olímpio Álvares, especializado nesse segmento, um ônibus movido a biometano já está circulando, em caráter de testes, no trânsito de São Paulo. Trata-se de um ônibus a diesel que recebeu um motor a biometano. Álvares avalia que, se os testes proporcionarem resultados positivos, a conversão dos ônibus pode representar uma alternativa de menor custo em relação a ônibus fabricados originalmente para o uso do biocombustível.
Devido aos problemas enfrentados com a Enel SP, a Prefeitura tem se mostrado mais cautelosa, nos últimos meses, em relação à questão da infraestrutura necessária para a distribuição do biometano. O prefeito Ricardo Nunes já declarou que 90% das garagens encontram-se próximas da rede de gás canalizado.
A Abiogás informa que o estado de São Paulo conta com 181 plantas com potencial para produzir 6,4 milhões de m³/dia de metano, envolvendo o aproveitamento de vinhaça, torta de filtro e resíduos de aterros sanitários. Atualmente, estão em operação plantas que produzem 400 mil m³/dia do biocombustível
Gás Verde, como potencial fornecedora
A Gás Verde, um dos principais produtores de biometano do país, comemorou a decisão da Prefeitura de São Paulo de abrir caminhos para o biocombustível na descarbonização do transporte urbano de passageiros. “O decreto cria demanda contratual estável por parte das operadoras de transporte, que passam a contar com os produtores para cumprir as metas. A Gás Verde vai se tornar fornecedora estratégica, garantindo abastecimento contínuo em escala metropolitana e apoiando o município nessa transição energética’, disse o presidente da companhia, Marcel Jorand (foto).
A Gás Verde conta com plantas operando nos estados do Rio de Janeiro e São Paulo e executa um plano de expansão da oferta do biocombustível. O biometano produzido pela Gás Verde é certificado, atendendo às exigências do decreto da Prefeitura, inclusive no que se refere à comprovação por meio dos Certificados de Garantia de Origem do Biometano (CGOBs), segundo Jorand.
As duas plantas da Gás Verde em operação produzem 160 mil m3/dia de biometano. A empresa pretende ampliar sua capacidade de produção para 650 mil m³/dia até 2028. “Recentemente, recebemos financiamento de R$ 131,1 milhões do BNDES, grande parte do Fundo do Clima, para construção de duas plantas.”
Falta de infraestrutura de carregamento
O prefeito Ricardo Nunes terminou o seu primeiro mandato, em dezembro do ano passado, sem cumprir a meta de substituir 20% da frota de ônibus a diesel por veículos elétricos. No final do ano passado, menos de 4% da frota de ônibus da capital eram movidos por fontes de energia limpa. Ao iniciar seu segundo mandato, Nunes previu a substituição de 2.200 ônibus a diesel por veículos movidos a fontes limpas.
O prefeito tem atribuído à Enel SP a responsabilidade pelo não cumprimento da meta. Segundo a Prefeitura, a concessionária não está promovendo, no ritmo necessário, a implantação da infraestrutura de carregamento dos ônibus nas garagens das companhias de transporte público.
Em agosto, a Enel SP informou que havia instalado na capital infraestrutura elétrica com 44 MW em 20 garagens, o suficiente para abastecer 980 ônibus elétricos. A concessionária afirmou que ampliará, até o final do ano, o fornecimento para 88 MW, distribuídos entre 38 garagens.
Prefeitura de São Paulo recebeu 120 ônibus elétricos no final de julho, mantendo a eletrificação da frota, que já conta com 841 veículos (Foto: Divulgação)
O lançamento do programa de estímulo à adesão ao ônibus a biometano, contudo, não significa que a Prefeitura de São Paulo abandonará a eletrificação. No final de julho, a Prefeitura anunciou a entrega de mais 120 ônibus elétricos, ampliando a frota do município para 841 unidades movidas a eletricidade – o equivalente a 6,3% da frota total.
Para contornar o déficit na ligação das garagens à rede elétrica, a Prefeitura informou que estão prontos sete projetos-piloto para instalação de carregadores próprios com o uso de baterias BESS. Ao todo, 44 carregadores serão instalados em sete garagens, nas quais abastecerão cerca de 400 ônibus. A experiência é fruto de protocolo de intenções firmado entre a Prefeitura e as empresas Huawei e Matrix.
Biometano em caminhões de lixo
O uso do biometano em caminhões que fazem a coleta de lixo na capital paulista serviu de laboratório para a Prefeitura de São Paulo avaliar a adoção do biocombustível pela frota de ônibus urbanos. A substituição de caminhões a diesel por modelos a biometano foi instituída pela Prefeitura como exigência para a renovação dos contratos das concessionárias de coleta de lixo.
Segundo informações da Prefeitura, atualmente 125 caminhões de lixo circulam pela capital paulista utilizando o biometano como combustível. A previsão é elevar essa frota para 608 caminhões até 2027. Os caminhões são abastecidos com o biometano produzido nos próprios aterros sanitários que recebem o lixo.
A Ecourbis, que coleta resíduos em bairros das zonas Sul e Leste da capital, pretende contar até outubro com 147 veículos (caminhões compactadores e carretas) movidos a biometano. A empresa utiliza, para abastecer seus veículos, o biometano produzido em uma usina instalada no Aterro Sanitário CTL, construído e operado pela concessionária.
Atualmente 125 caminhões de lixo a biometano circulam pela capital de São Paulo, com previsão de chegar a 608 até 2027 (Foto: Divulgação)
Atualmente, a concessionária coleta diariamente, em média, 7 mil toneladas de resíduos, utilizando uma frota superior a 500 veículos, entre caminhões compactadores, carretas, furgões especiais para a coleta de RSS (lixo hospitalar) e carros de apoio.
A empresa informa que a inserção dos caminhões a biometano nas rotas de coleta de lixo foi uma determinação da Prefeitura e atende às diretrizes do Plano de Ação Climática do Município de São Paulo, o PlanClima SP. Para a Ecourbis, a medida “representa uma contribuição concreta para reduzir a emissão de poluentes e Gases de Efeito Estufa (GEEs). Um indicador claro nesse sentido é que, anualmente, um caminhão utilizado na coleta de resíduos consome 35 litros de óleo diesel.”
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