Reposição de Reservas de Óleo e Gás, desafios e oportunidades

Opinião

Reposição de Reservas de Óleo e Gás, desafios e oportunidades

Como o Brasil pode aumentar suas reservas para assegurar um período mais longo de produção além de garantir um volume excedente de produção para exportação, aproveitando a demanda global por petróleo?

Por José Almeida

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Coautores:  Lincoln Guardado, Vagner Beraldo e Bruno Leonel

As reservas provadas de petróleo e gás brasileiras atuais são suficientes para 15 anos, mantido o consumo atual. Com as reservas prováveis pode-se chegar a 30 anos. É tempo suficiente para atender à demanda? Qual a reserva necessária para manter a produção por mais tempo?

O Brasil já produziu mais de 25 bilhões de barris de petróleo nos últimos anos, quando houve um substancial incremento na produção anual devido aos campos do pré-sal na Bacia de Santos. Se consideramos  as reservas 3P e  os recursos, teríamos em torno de 36 bilhões de barris, o que sustentaria cerca de 30 anos de produção, considerando os volumes atuais de 1,2 bilhão de barris por ano.

Esse seria um número confortável? Acredito que sim, pela expectativa de vida da indústria de petróleo, e tendo em vista o avanço das fontes renováveis ou alternativas de energia, das quais o Brasil é um dos líderes mundiais.

Há uma grande diferença entre as reservas terrestres e marítimas, notadamente as da Bacia de Santos, do Pré-sal. Dessas mais de 30 bilhões de barris das reservas 3P e Recursos, mais de 22 bilhões são da Bacia de Santos, basicamente dos campos do pré-sal.  O que deve ser feito para agregar mais reservas e para que as reservas  3P se tornem, ao menos em parte, reservas 1P?

Um dos desafios que o Brasil tem será para quem exportar o excedente de petróleo produzido e torná-lo, definitivamente, um dos principais itens de nossa pauta de exportação, quem sabe o primeiro, como já foi em 2024.

Tabela de reservas por bacia

Fonte ANP:  Reservas brasileiras de óleo em milhões de barris 2024

Associado ao petróleo há um grande volume de gás que demanda, urgentemente, a construção de infraestrutura para que possa ser utilizado, visto que o Brasil ainda continua importando esse combustível para suprir o consumo interno.

Quais mecanismos o Brasil poderá adotar para manter os níveis de produção por um período mais longo, aumentando as reservas nos níveis 1P e 2P e assegurando, ao mesmo tempo, que todo o petróleo produzido seja consumido localmente e o excedente seja exportado?

O Brasil apresenta uma situação muito vantajosa por ter uma matriz energética com cerca de 50% de fontes renováveis, ou quase 90% se considerada apenas a matriz elétrica. Além disso, conta com os biocombustíveis, que possuem uma elevada participação na matriz, onde 30% da gasolina já está misturada com etanol, e há um uso robusto de gás para abastecimento da frota de veículos. Essa situação permite que grande parte do petróleo produzido possa ser exportado.

Como Aumentar as Reservas Nacionais de Petróleo?

Ao longo da história brasileira da exploração e produção de petróleo, o Brasil tem conquistado sucessivamente patamares crescentes de conhecimento, desenvolvimento tecnológico e excelência operacional, principalmente na porção offshore. Isso o posiciona na vanguarda da exploração das bacias de águas profundas e ultra profundas. Destacam-se aqui as similaridades que essas bacias brasileiras apresentam com outras já consolidadas como produtoras de petróleo.

Margem Equatorial

Na Margem Equatorial brasileira, as bacias da Foz do Amazonas, Pará-Maranhão, Barreirinhas, Ceará e Potiguar têm semelhança com as bacias da Guiana (Campo de Liza, com Reservas Provadas de 11 bilhões de barris - 75% do total do Brasil; Produção em 2019: 650 a 900 mil bbl/dia e 28 milhões m³/gás) e Suriname (Campos Sapakara e Krandagu com recursos estimados em 700 MM boe) e apresentam elevado potencial petrolífero, em nossa avaliação.

A Bacia Foz do Amazonas é a mais próxima da Guiana e Suriname, fica a 600 km da descoberta  de Zaeudyus na Guiana Francesa, em arenitos do Cenomaniano/Turoniano. Já foram perfurados quase 100 poços na Bacia da Foz do Amazonas, praticamente todos em lâmina d água rasa, sem descobertas comerciais, mas com indícios. A parte mais ao sul pode ter seu risco exploratório aumentado por ficar mais distante das descobertas da Guiana e Suriname. Apesar de correntes marítimas, consegue-se operar sem maiores dificuldades.

Em 2012, na Bacia do Ceará, foi confirmada a presença de hidrocarbonetos com bons indícios na área de Pecém, no poço 1-CES-158, em lâmina d’água de cerca de 2.000 m. Na Bacia de Potiguar, em 2024, foram emitidas duas Declarações de Descoberta (Anhangá e Pitu Oeste) em águas ultra profundas (mais de 2.000m de lâmina d'água), com avaliação de comercialidade a ser realizada.

Mapa da Margem Equatorial

Fonte: ANP -  Bacias da Margem Equatorial (Fonte GEOMAP-ANP)

A intensificação do esforço exploratório nas bacias da Margem Equatorial pode ser o caminho para a possível reposição  das reservas brasileiras. Para fomentar a campanha exploratória, é desejável incrementar os incentivos para as empresas privadas, visto que essas bacias, por não serem bacias maduras, possuem alto risco exploratório, o que demanda maiores investimentos.

Embora com razoável disponibilidade de dados Sísmicos 3D, pré e pós-Stack, sendo que alguns estão em período de confidencialidade, há uma imensa área sem cobertura, principalmente na Bacia Pará-Maranhão. É necessário que haja incentivo para aquisição de dados nessas bacias.

Bacias da Margem Leste

A Bacia do Espírito Santo, possui grandes descobertas de gás em águas profundas e apresenta um grande potencial a ser explorado, assim como nas bacias de Santos e Campos, nas áreas do pré-sal. Nos campos já descobertos em águas ultra profundas, os volumes de petróleo são expressivos, podendo haver uma maior distribuição horizontal dos reservatórios em posições com maiores complexidade para mapeamento devido às camadas de sal acima dos reservatórios.

O refinamento do mapeamento sísmico 3D e 4D deve aumentar os potenciais remanescentes de Reservas que possam existir nesses campos, dada a profundidade em que se encontram e que ainda não foram identificados pelo atual mapeamento e poços perfurados.  

A produção desses upsides pode ser difícil pelas posições atuais dos FPSOs, normalmente posicionados sobre a área principal dos campos. Novas oportunidades implicariam numa reconfiguração do sistema de produção,  o que poderá impactar em seus custos, considerando que as produtividades dos poços possam ser menor que as atuais e de custo operacional por barril produzido mais elevado.

A Bacia de Pelotas, no extremo sul do Brasil, está em uma fronteira exploratória, sendo também considerada como possível fonte de reservas adicionais, principalmente se considerarmos alguma similaridade com a Bacia de Orange localizada na margem atlântica da Namíbia, com importantes descobertas de óleo e com grandes volumes de gás associado, ocorridas principalmente após 2022, em águas profundas.

Rochas do Aptiano são consideradas potenciais geradoras de hidrocarbonetos - com concentração de carbono orgânico total acima de 2%, chegando a 6% em alguns casos, e presença de querogênio tipo II, que é propício para a geração de petróleo, estágio inicial da janela de geração de óleo.

Entretanto, destacam-se fatores negativos que potencializam sobremaneira os riscos geológicos e operacionais.   Estima-se que a profundidade dessa bacia chegue até a 9.000 m de sedimentos e as seções supostamente geradoras possam estar a grandes profundidades, sendo as acumulações fortemente dependentes de migração.

Vinte poços foram perfurados até o momento, sem resultados. O último poço foi o 1-BRSA-161-RS, indo até a profundidade de 2.379m, ainda no Oligoceno, numa seção predominantemente argilosa e inconsistente, com a perfuração interrompida, por problemas operacionais, por perda de circulação.

Foram ofertados 44 Blocos na 4ª. Rodada de Oferta Permanente em 2023, tendo a Petrobras adquirido três em parceria com a Petrogal.

Bacias Offshore no Exterior

Integrando o desafio estratégico de incrementar as reservas brasileiras, inclui-se também o investimento em exploração de águas ultra profundas fora do Brasil, preferencialmente em bacias do Atlântico. Nessas regiões, o Brasil já possui excelente conhecimento da geologia e do potencial desses depósitos.

Nessas áreas, destacam-se as bacias do oeste africano, da Costa Americana e Caribe e as bacias ao Norte do Brasil, nas áreas das bacias das Guianas e Suriname, e ao sul do Uruguai. Estas últimas apresentam possível semelhança com o sul do Leste Africano, incluindo Namíbia e África do Sul. Esses dois países têm noticiado importantes descobertas em águas ultra profundas.

Foi noticiado recentemente que a Petrobras negociou a exploração de alguns blocos de águas profundas e ultra profundas na costa Oeste Africana, com boas indicações de potencial para o pré-sal, semelhante ao que ocorre no Brasil nas bacias de Santos e Campos. Sendo a Petrobras uma das líderes mundiais nessas atividades, o que constitui um diferencial competitivo e estratégico, é acertada a decisão de sua participação em projetos no exterior, como mais um caminho para o aumento das reservas.

Bacias Terrestres

A Bacia de Solimões, com cerca de 600 mil km², é atualmente a maior produtora de óleo e gás natural entre as bacias terrestres brasileiras, com quase 100 mil barris de boe/dia, e possui poucos campos. Isso pode indicar um bom potencial para novas descobertas com dimensões semelhantes ou até maiores.

Existe hoje um excedente de gás já descoberto, de 8 milhões de m³/dia, que está sendo injetado por falta de infraestrutura de aproveitamento. Desenvolver toda a infraestrutura para escoamento do gás, principalmente para o centro-oeste, é uma estratégia vital.

A Bacia do Paraná, localizada na região sul do país, com uma área de 1,4 milhão de km², cobrindo o maior mercado consumidor de gás do Brasil, pode, em nossa visão, contribuir também com o incremento das reservas brasileiras de hidrocarbonetos. Além do potencial de gás, embora ainda com poucas acumulações (Campo de Pitanga) na extensa área da bacia, há a possibilidade de utilização do "xisto" (folhelhos betuminosos da Formação Irati), que podem também agregar reservas tanto de gás quanto de óleo. No entanto, sua viabilidade econômica é desafiadora e condicionada ao preço do petróleo e aos custos de produção.

Já existe autorização e planos para o aproveitamento desse xisto, aprovados pela ANP para projetos em andamento, o que poderia facilitar futuros investimentos nessa área.

Aumento no Fator de Recuperação

A utilização de nanotecnologias para o aumento do fator de recuperação tem demonstrado que, em certos casos, o fator de recuperação pode aumentar em até 50% devido ao efeito da modificação da aderência do óleo ao reservatório. Considerando somente o volume de óleo dos reservatórios com base nas reservas 2P atuais e no volume já produzido, estima-se um incremento superior a 200 bilhões de barris de volume in place nos reservatórios, o que poderia gerar um volume adicional de reservas com possível recuperação adicional pela aplicação da nanotecnologia.

Se considerarmos um aumento de apenas 10% em relação ao fator de recuperação normal da indústria (em torno de 30%), poderíamos ter um acréscimo de aproximadamente 20 bilhões de reservas adicionais, portanto superior às reservas 1P atuais.

De um modo geral quanto mais poços forem perfurados mais óleo tem possibilidade de ser produzido, porque a área de drenagem no reservatório aumenta. Porém, a perfuração de poços de redução de malha é utilizada em último caso, devido aos altos custos envolvidos. Poços radiais têm sido eficazes para aumentar a produção de um reservatório, já que vários poços são perfurados a partir de um poço principal já existente.

Essa prática já vem sendo largamente utilizada na Rússia e nas antigas repúblicas soviéticas com grande sucesso, principalmente onde existe óleo mais pesado e viscoso e de difícil produção. Esses poços radiais têm sido também muito utilizados para facilitar a injeção de ácidos e nanopartículas nos reservatórios, já que eles penetram mais dentro dos mesmos.

Há bons fundamentos técnicos para o aumento das reservas brasileiras de petróleo. Haverá incentivos governamentais para que esses recursos sejam aproveitados enquanto o mundo ainda é consumidor de petróleo? Ou vamos deixar passar essa oportunidade de agregar mais riquezas? Existe uma tendencia atual de retorno aos campos gigantes terrestres do Oriente Médio e Rússia com objetivo de intensificar a busca por óleo que ainda possa existir e ainda não foi totalmente mapeado pela sísmica e pela perfuração dos poços. No caso do Brasil os campos terrestres são de pequenas reservas que foram super explotados pela Petrobras, até o momento de sua venda.

A riqueza intelectual que a Petrobras e outras empresa desenvolveram no Brasil deve ser aproveitada para tentar aumentar as reservas de petróleo e dar uma vida mais longa aos campos já descobertos e a descobrir. Esse é um ativo muito importante existente no Brasil, que deve ser bem aproveitado.

Bruno Leonel é geólogo na Petroil Óleo e Gás. Lincoln Guardado é geólogo, conselheiro e consultor na área de petróleo. E Vagner Beraldo, geólogo e geofísico, atua também como consultor na área de petróleo e gás.

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